Aos 81 morre Boothby, persistente advogado adventista da liberdade religiosa

Foi o primeiro de seu tipo dentro da Igreja Adventista em litígios por questões de Igreja e Estado

Silver Spring, Maryland, United States | Andrew McChesney/Adventist Review

Lee Boothby, um dos primeiros adventistas e precursor em defesa dos direitos de observância do sábado, morreu com a idade de 81 anos do dia 4 de novembro em uma residência de cuidados especiais, perto de sua casa, em Berrien Springs (Michigan, EUA), segundo disseram familiares e amigos. 

Em 2013 ele se mudou para o estado do Michigan, depois de sofrer um acidente vascular cerebral, em Washington DC, onde trabalhou a maior parte de sua carreira e teve um escritório até adoecer.  

Boothby foi um militante da causa de direitos trabalhistas dos adventistas e outros crentes nas décadas de 1960 e 1970, ajudando a desenvolver a definição legal dos arranjos por motivos religiosos no trabalho. A questão veio à tona depois que o Congresso dos Estados Unidos sancionou a Lei dos Direitos Civis de 1964, um marco legislativo que proibia a discriminação com base em raça, cor, religião, sexo ou origem nacional. 

“A nível nacional, se houve alguém que desenvolveu o conceito de arranjos por motivos religiosos no trabalho, esse foi Lee Boothby”, disse Robert Nixon, um amigo próximo que começou a trabalhar com Boothby como jovem advogado em 1974 e se apresentou junto com ele perante a Suprema Corte dos Estados Unidos.  “Ele era implacável sobre as obrigações dos empregadores”, acrescentou Nixon, que se aposentou em 2005 como conselheiro geral da Associação Geral. 

Boothby começou a lidar com casos de arranjos de trabalho por motivos religiosos antes que a Associação Geral, órgão administrativo da Igreja Adventista a nível mundial, nomeasse um assessor jurídico para auxiliar em questões de liberdade religiosa. Boothby ocupou brevemente esse posto na Associação Geral.

“A contribuição de Lee para a Igreja e os litígios ocorreram num momento em que a Igreja Adventista não tinha muitos advogados, e estava apenas há pouco formando sua equipe de liberdade religiosa”, disse Todd McFarland, que supervisiona casos de liberdade religiosa como assessor jurídico associado da Associação Geral. “Ele era um líder”. E acrescentou: “A Igreja Adventista e pessoas de outras religiões estão em dívida com Lee Boothby por sua contribuição à liberdade religiosa ao longo das décadas”.

Boothby foi um dos principais defensores da Primeira Emenda dos Estados Unidos, que estabelece um muro de separação entre Igreja e Estado. Nenhum crente estava fora dos limites e, além de muitos adventistas, entre seus clientes havia membros da Ciência Cristã, Cientologia e Hare Krishnas.

Na década de 1990, Boothby levou sua luta para o antigo bloco soviético, visitando muitos países da Europa Oriental para promover o conceito de liberdade religiosa sob suas novas constituições. 

Orva Lee Boothby nasceu em 17 de março de 1933, em Bakersfield (Califórnia, EUA). Recebeu seu nome segundo um pastor querido, Orva Lee Ice, mas quando entrou para a faculdade de Direito na Universidade Estadual de Wayne, em Detroit, decidiu arquivar o seu primeiro nome. Por um tempo viveu à sombra de seu pai, Robert Loren Boothby, um evangelista adventista de renome, que batizou centenas de pessoas.

“Quando eu era jovem, parecia que todo mundo que eu conhecia tinha sido batizado por meu avô”, disse a filha mais velha de Boothby, René Robin Allen.

Mas Boothby, que frequentou a Universidade Andrews, tinha pulso e uma determinação que atraiu a atenção de pessoas que concluíram estudos na faculdade de direito em 1957, amigos disseram. Antes da promulgação da Lei dos Direitos Civis, em 1964, ele já tinha feito nome como litigante principal em casos que envolviam direitos individuais de consciência e de oposição religiosa. 

“Lee foi o primeiro e, durante muito tempo, o único e mais influente litigante de questões de Igreja e Estado na Igreja Adventista”, disse Mitchell Tyner, seu amigo de longa data, que se aposentou da Associação Geral como consultr legal em 2006.

Boothby trabalhou como conselheiro geral de várias organizações, incluindo Americanos Unidos pela Separação entre Igreja e Estado, Comissão Internacional de Liberdade de Consciência, e Academia Internacional para a Liberdade de Religião e Crença.

Boothby preocupava-se que os políticos norte-americanos estivessem derrubando blocos do muro de separação entre Igreja e Estado, para criar uma nova religião de compromissos que não ofendesse a ninguém.  “O que estamos vendo mais e mais é uma nova religião secular do Estado”, disse Boothby à revista ‘Time’, numa reportagem de capa de 2001 sobre relações entre a Igreja e Estado. “Na verdade, isso não é religião”.

Boothby não permitiria que isso acontecesse, e acompanhava casos em muitos tribunais, incluindo o Supremo Tribunal de Justiça, o Tribunal de Apelação dos Estados Unidos, o Tribunal Administrativo Fiscal, entre outros. 

Sua filha, Robin Allen, disse que seu pai preferia tirar férias em lugares quentes, como o Havaí ou Jamaica, mas a prioridade sempre foi o seu trabalho. “Meu pai era um viciado em trabalho extremo e, às vezes tivemos que interromper nossas férias”, contou Allen. “Lembro-me de procurar por todos os lugares um telefone para ele fazer uma chamada”. 

Mesmo após o acidente vascular cerebral, Boothby continuou a revelar interesse por seus clientes. Eles o visitavam no hospital em Washington, onde permaneceu por vários meses antes de se mudar para Michigan.

“Ele não era apenas seu advogado, mas também seu amigo”, disse Allen. 

A filha de Boothby disse que o seu pai tinha uma relação muito pessoal com Deus, e nunca impôs suas crenças sobre os outros. “Creio que isso foi devido a sua forte convicção de que a religião é uma decisão pessoal, e cada indivíduo deve ter o direito de escolher o tipo e o objeto de adoração que quiser”, concluiu.

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