POR QUE A IGREJA ADVENTISTA DO SÉTIMO DIA TEM PRESENÇA NO SETOR PÚBLICO?

Compreendendo as Relações Interreligiosas: Entrevista com o diretor de Relações Públicas e Liberdade Religiosa da IASD

Silver Spring, Maryland, United States | Bettina Krause, communication director, International Religious Liberty Association

O Dr. Ganoune Diop, diretor de Relações Públicas e Liberdade Religiosa (PARL) para a Igreja Adventista do Sétimo Dia a nível mundial, recentemente retornou de dois grandes encontros internacionais: uma reunião da Conferência de Secretários das Comunhões Cristãs Mundiais, realizada em Roma, Itália; e o Concílio Africano de Líderes Religiosos, Religiões pela Paz, que teve lugar em Abuja, na Nigéria.

Ele se sentou com a diretora de Comunicação do PARL, Bettina Krause, para falar por que aceita convites para representar a Igreja Adventista nestes e muitos outros eventos semelhantes. 

Bettina Krause: Sua agenda de viagens é preenchida por uma ampla gama de reuniões diferentes, incluindo encontros religiosos, eventos patrocinados por organizações internacionais, como as Nações Unidas, e visitas a líderes seculares e políticos. Por que o PARL se envolve com grupos e indivíduos como esses? 

Ganoune Diop: As duas primeiras palavras no nome de nosso departamento—“Relações Públicas”—descrevem sucintamente uma parte essencial de nossa missão. Em todas as nossas atividades, buscamos situar a Igreja numa posição de visibilidade, credibilidade, confiança e relevância na esfera pública. Isso significa estar preparado para compartilhar a missão e os valores da Igreja Adventista com qualquer pessoa, seja um funcionário público ou representante de outro grupo religioso. Nosso departamento aqui na Associação Geral, e cada diretor do PARL em cada Divisão da Igreja pelo mundo, tem essa responsabilidade de trabalhar para moldar as percepções públicas sobre nossa Igreja e formar relacionamentos úteis com as pessoas de influência na sociedade.

Isso se tornou cada vez mais importante com o rápido crescimento da Igreja Adventista nas últimas duas décadas—mais de 20 milhões de membros na última contagem—e na medida em que a Igreja continua a expandir o alcance de sua missão. Com uma presença crescente no mundo, precisamos dizer às pessoas quem somos, ao invés de confiar na interpretação de outras pessoas. Queremos nos apresentar em nossos próprios termos.

BK: Muitas pessoas equiparam o departamento PARL com a defesa da liberdade religiosa, que é, de fato, uma grande parte do que fazemos. É esta ênfase no trabalho de  “Relações Públicas” do departamento um desdobramento recente? 

GD: Não, de jeito nenhum! Esta responsabilidade é parte do mandato votado de nosso departamento. É parte da missão explícita do PARL, segundo enunciada na Praxe de Trabalho da Associação Geral. Esta praxe confia ao PARL o trabalho das relações interreligiosas e a formação de relações com várias pessoas de influência. É importante notar que isso não é ecumenismo, em seu sentido negativo. Não se trata de diluir a identidade da Igreja ou sua voz profética—absolutamente não. De fato, trata-se de ser fiel à missão que Cristo deu à Sua igreja. É impossível para a Igreja Adventista cumprir sua missão sem se misturar com outras pessoas. Creio ser isso fundamental. Devemos estar preparados para encontrar líderes políticos, líderes cristãos, outros líderes religiosos, ateus, e ser capazes de dar conta da fé que está dentro de nós. Não podemos completar nosso mandato bíblico se excluirmos grupos ou indivíduos do alcance de nosso testemunho.

Então, como um departamento, buscamos plataformas e fóruns onde podemos testemunhar sobre quem são os adventistas e o que fazemos no mundo. 

BK: Está envolvido neste trabalho desde 2011, primeiro como homem de ligação junto às Nações Unidas e outras organizações internacionais, e desde 2015 como diretor do departamento. Já viu esses esforços de contatos e formação de relacionamentos produzir quaisquer benefícios tangíveis para a Igreja ou sua missão? 

GD: Sim, tenho visto isso! No nível mais básico, é claro, nós nos beneficiamos simplesmente por estar sendo fiéis à missão que Deus nos deu de ser luz e sal no mundo. Para sermos obedientes a este mandamento, temos de nos misturar; isso é parte de testemunhar e parte de seguir o exemplo de Cristo, que nas palavras de Ellen White, “Se misturava com os homens como alguém que desejava o seu bem”.

É claro que, à medida que procuramos ser sal no mundo, devemos nos proteger contra o perigo de perder o nosso “sabor”. Mas o temor de perder nossa mensagem ou identidade não invalida a missão em si! De um ponto de vista lógico, isoladamente isso não faz sentido. O risco nos alerta para ter cuidado, mas não anula a nossa responsabilidade. 

Outro benefício tangível que eu testemunhei, muitas vezes, é que as pessoas ouvem sobre nós e aprendem sobre nós a partir de nossas próprias palavras, ao invés de por segunda mão ou através da interpretação de alguém que pode ser hostil à Igreja Adventista. Ao passar tempo com líderes religiosos ou seculares, podemos dissipar preconceitos e construir confiança. Eles começam a ver que a Igreja Adventista não é um grupo isolado que se concentra apenas em si mesmo. Começam a entender que a Igreja tem toda uma carteira de serviços—humanitários, de saúde, de educação e muito mais—que oferecemos à sociedade. Veem que apoiamos e ajudamos nossos irmãos e irmãs na humanidade e que amamos as pessoas, genuína e autenticamente, como Jesus fez.

BK: Suponho que alguém poderia perguntar, “Ter uma boa reputação pública é realmente tão importante?” Já viu um exemplo onde isso fez a diferença para a Igreja Adventista?

GD: Em fevereiro deste ano, eu estava em Moscou, na Rússia, participando de uma reunião do Fórum Cristão Global. Este é um encontro onde os líderes cristãos se encontram para entender melhor uns aos outros e para falar sobre preocupações comuns, como a perseguição de cristãos ao redor do mundo. Enquanto estávamos sentados ao redor da mesa, o secretário anterior do grupo, Hubert van Beek, falou sobre uma recente visita que fez ao Oriente Médio. Enquanto estava lá, ele se reuniu com líderes cristãos regionais e eles estavam discutindo uma proposta para remover os adventistas do sétimo dia da lista de Igrejas cristãs oficiais. Você pode perguntar: “Por que isso importa?” Bem, se a Igreja Adventista não tivesse qualquer reconhecimento do governo, suas atividades de repente se tornariam extremamente restritas. Perderia o seu estatuto jurídico. Nem sequer seria capaz de possuir propriedades—como uma Igreja—para o propósito de adoração.

Bem, Hubert falou. Ele disse a esses líderes cristãos que tinha contato regular com os adventistas todos os anos no Fórum Cristão Global. E ressaltou que os adventistas eram realmente cristãos—não uma seita marginal. E o resultado foi que a Igreja Adventista manteve o seu status legal e sua capacidade de funcionar dentro desse país.

Tenho ouvido de muitos outros exemplos. Faz uma diferença prática se a Igreja Adventista é percebida como uma organização confiável e reconhecida internacionalmente. Nossa capacidade de funcionar, realizar missão e estabelecer instituições adventistas pode ser em grande parte dependente de como somos vistos pelo governo e outros grupos religiosos dominantes. Acabei de voltar da Nigéria. Lá, nossa denominação é conhecida como uma Igreja confiável e orientada a serviços que são uma bênção para a sociedade através de nossos hospitais e escolas.

Além disso, assim como queremos que outras pessoas nos conheçam em nossos próprios termos, é importante também que entendamos os outros—inclusive outros grupos religiosos—em seus próprios termos. Não nos serve bem ver os outros de uma posição de ignorância ou preconceito. Ouvir as pessoas, mesmo que não concordemos com elas, pois elas compartilham suas esperanças, medos e aspirações, nos ajuda a compreendê-las melhor. Permite-nos saber o que podemos oferecer-lhes que possa repercutir ante suas necessidades. 

Devemos ter uma compreensão madura de por que nos misturamos e nos envolvemos com as pessoas—crentes ou ateus, pré-modernos, modernos ou pós-modernos, seculares ou pós-seculares. Ninguém é excluído do âmbito da nossa missão. 

BK: Recebe muitos convites diferentes de vários grupos, bem como solicitações para falar em eventos. Como decide se aceita um convite? Que critérios utiliza para determinar o que se ajusta ou não à missão que acabou de descrever?

GD: Bem, as pessoas nos convidam porque acham que os adventistas têm algo para trazer à mesa. Na Nigéria, no Concílio Africano Para Líderes Religiosos, a discussão foi sobre a construção de uma sociedade mais pacífica e tolerante. E assim fui convidado a falar porque acreditavam que os adventistas tinham uma perspectiva teológica, bíblica, que poderia trazer algo significativo para a discussão da coexistência pacífica.

Então, meu primeiro critério é, podemos levar algo para beneficiar essas pessoas? E, ao mesmo tempo, tenho de perguntar: Há também um benefício para a nossa Igreja? Será que vai dar visibilidade? Construir credibilidade e confiança? Quebrar barreiras de preconceito e desinformação? Fornecerá uma oportunidade de compartilhar valores adventistas? Ajudar a posicionar-nos como pessoas que não querem ser isoladas da sociedade, mas ser uma bênção nas comunidades onde vivemos e compartilhar a mensagem bíblica profética que nos foi confiada do céu?

Quando Deus chamou Israel, foi com o propósito de ser uma bênção para o mundo. Creio que o chamado da Igreja Adventista também está ligado ao desejo de Deus de abençoar o mundo através de nós. Ele não nos chamou porque somos seres humanos excepcionais, ou porque merecemos um tratamento especial. Não, Ele nos chamou para ser uma luz para o mundo; para ser uma expressão tangível do amor de Cristo pelo mundo. Tudo isso faz parte do que nosso departamento—PARL— procura expressar e encarnar.

É por isso que estou comprometido em reunir-me com líderes de outras denominações cristãs, líderes de grupos religiosos, bem como líderes seculares e políticos—sem exceção.

Desde 2014, foi-me confiado o papel de Secretário de um grupo chamado Conferência de Secretários de Comunhões do Mundo Cristão. Este é um grupo de líderes de uma ampla gama de denominações cristãs. Sim, existem diferenças doutrinárias que são impossíveis de conciliar. Não pode acontecer. Mas ainda podemos conversar e coexistir pacificamente. Quando me encontro com esse grupo, simplesmente compartilho quem somos, o que estamos fazendo e como ajudamos a sociedade. Ao contrário de organizações como o Conselho Mundial de Igrejas, não há objetivos compartilhados ou condições de adesão ou taxas— nem sequer mantemos atas. Trata-se de relações puramente interreligiosas—um esforço para entender melhor os outros e tornar o adventismo mais compreendido também. 

Em minha função no PARL, eu me encontro com muitos líderes, tanto de tradições de fé cristãs como não-cristãs. Na Nigéria, no início deste mês, passei um tempo com o Sultão de Sokoto, considerado o líder espiritual de setenta milhões de muçulmanos do país. Também neste mês, em Roma, conheci muitos líderes cristãos, incluindo os da Comunhão Anglicana, da Aliança Batista Mundial, da Federação Luterana Mundial, da Conferência Mundial Menonita, do Exército de Salvação, dos Católicos Romanos e de muitos outros. Nas próximas semanas, vou visitar líderes políticos seculares na Ásia Central e na África Ocidental. 

A Igreja Adventista do Sétimo Dia tem algo único para compartilhar com o mundo sobre a vida. Promovemos educação, saúde e justiça porque acreditamos que Deus, na criação, imbuiu os seres humanos com dignidade inata e valor infinito. Mas também temos algo a compartilhar sobre a vida que transcende o aqui e agora—a esperança da vida eterna por vir. 

Isso é o que me impulsiona e me motiva a conhecer todas essas pessoas. E essa responsabilidade de ser sal e luz para todos, em todos os lugares, é o que impulsiona o trabalho do PARL. O medo de perder nosso sabor— o medo da aliança sincrética—nunca deve sufocar a vitalidade da mensagem e a fidelidade ao Senhor da missão que compartilhamos com o mundo antes de Sua segunda vinda prometida.

arrow-bracket-rightComentárioscontact